Publicado recentemente na revista Nature Chemistry, um novo estudo está revolucionando a forma pela qual entendemos a estrutura da água na interface de soluções eletrolíticas simples. Segundo os autores, a distribuição de íons na interface ar/água é diferente da que a ensinada nos livros atuais.
Na Química tradicional, aprendemos que os íons maiores tendem a ser tensoativos, tomando como verdadeira a sua localização no topo da superfície da água, para induzir campos elétricos que determinam a estrutura interfacial da água. No novo estudo, os autores desafiam abertamente essa visão, usando técnicas de espectroscopia para obter medições mais sensíveis e seletivas.
Os pesquisadores realizaram simulações de dinâmica molecular para avaliar o funcionamento, taxa e rendimento das reações químicas. As duas técnicas mostraram "que os íons em soluções eletrolíticas típicas estão, de fato, localizados em uma região subterrânea".
Examinando a molécula de água com uma técnica mais sofisticada
Representações gráficas da polarização da água. Fonte: Yair Litman et al.
Para testar suas hipóteses, os autores se concentraram no ponto exato onde o ar e a água se encontram na solução eletrolítica (água salgada) para observar como as moléculas de água se comportam. Isso normalmente é feito com uma técnica de radiação laser conhecida como geração de soma vibracional de frequência (VSFG), que mede as vibrações moleculares.
Mas, como essa ferramenta não consegue medir se os sinais são positivos ou negativos, a equipe decidiu usar um modelo mais sofisticado chamado VSFG com detecção heteródina, que é capaz estudar diferentes soluções eletrolíticas. Com o auxílio de modelos computacionais avançados, os autores então simularam interfaces em cenários distintos.
Ao combinar os resultados, eles perceberam que tanto os cátions (íons positivos) quanto os ânions (íons negativos) são reduzidos na interface água/ar. Isso significa que cátions e ânions de eletrólitos simples orientam as moléculas de água tanto para cima quanto para baixo, o que subverte os livros didáticos, que mostram a formação de uma dupla camada elétrica orientando as moléculas em só uma direção.
Quais as implicações da nova visão das moléculas de água?
A mudança fundamental introduzida por este estudo foi descobrir que a superfície de uma solução eletrolítica simples é estratificada em camadas: uma superfície externa sem íons e outra subsuperficial ionizada, que determinam em conjunto a estrutura interfacial da água, que, no caso, se refere à organização molecular da água perto dos íons dissolvidos.
Em comunicado, o primeiro autor, Yair Litman, da Universidade de Cambridge, explica que "a subsuperfície enriquecida com íons determina como a interface é organizado: no topo há algumas camadas de água pura, depois uma camada rica em íons e, finalmente, a parte principal, a solução salina".
Para o coautor Mischa Bonn, professor do Instituto Max Planck, a nova visão sobre as moléculas de água pode ser usada para "estudar interfaces sólido/líquido, que poderiam ter aplicações potenciais em baterias e armazenamento de energia".