quarta-feira, 3 de julho de 2013

O Futuro (o passado e o presente também) é do Carbono


Carbono é uma palavra suja. Nós o queimamos demais, produzindo milhares de toneladas de dióxido de carbono que ameaçam destruir o clima de nosso planeta para as gerações vindouras. Antes disso, ele já era o vilão disfarçado de fuligem que saía das chaminés de fábricas e tornava as cidades escuras. É uma reputação e tanto para carregar.

Mas agora nosso inimigo de longa data pode estar prestes a se tornar nosso melhor amigo high-tech. À medida que aprendemos a modelar o carbono em nanoescala – em tubos e folhas; esferas e fitas -, horizontes totalmente novos e inesperados se abrem para nós. Os átomos de carbono que foram criados na fornalha das estrelas do universo podem ser combinados em materiais capazes de nos ajudar a obter energia a partir de nossa própria estrela. Materiais similares prometem fazer nosso mundo eletrônico funcionar com uma eficiência sem precedentes, e podem até guardar o segredo para fazer nossas preciosas reservas de petróleo durar mais.

O potencial de carbono vem do fato de ele ser multiuso. Grupos de átomos de carbono unem-se de boa vontade em múltipla variedade de estruturas, de diamante a grafite, mas essas formas familiares são apenas o começo. Nas últimas décadas, aprendemos sobre as estruturas em forma de bola de futebol chamadas "buckyballs", logo seguidas pelos microscópicos "rolos de arame", que conhecemos como nanotubos de carbono. Juntou-se a eles mais recentemente o grafeno – folha de carbono que tem apenas um átomo de espessura.

Dessas intrigantes estruturas, o grafeno é a que está causando o maior alvoroço. Isto se deve, em parte, à sua combinação incomum de propriedades: sua malha bidimensional no formato de uma colmeia de átomos de carbono oferece, ao mesmo tempo, fantástica condutividade elétrica e dez vezes a força do aço, num material que é transparente à luz visível. E o melhor de tudo é que finalmente aprendemos como fazê-lo.

Esta última descoberta aconteceu em 2004, quando Andre Geim e Kostya Novoselov, da Universidade de Manchester, no Reino Unido, descobriram que podiam produzir folhas de grafeno a partir de uma mancha de grafite, simplesmente removendo camadas com um pedaço de fita adesiva. O truque foi seguido por uma enxurrada de métodos aprimorados. Depois de apenas cinco anos de desenvolvimento, produzir grafeno é mais simples do que se imaginava, e a fabricação em escala industrial é apenas uma questão de demanda.

Nos gadgets
Após Geim ter isolado os primeiros flocos, ficou rapidamente claro para os teóricos que esse material devia ter algumas propriedades muito especiais.

Na época havia pouco material disponível para experiências. "Agora é muito diferente", diz Vítor Pereira, da Universidade de Boston. "Há mais experimentos que trabalhos teóricos … Isso é realmente animador, porque é a partir dos resultados experimentais que os verdadeiros avanços acontecem."

A grande inovação em que todo mundo está de olho é o potencial do grafeno para revolucionar os nossos gadgets, já que os elétrons viajam pelo material de uma forma particularmente eficaz, Em condutores e semicondutores convencionais, tais como o cobre e o silício, os elétrons colidem com os átomos e dissipam sua energia na forma de calor, um chip de computador típico desperdiça de 70% a 80% da sua energia elétrica dessa forma. Isso significa que às vezes os materiais podem esquentar o bastante para distorcer ou até mesmo destruir os circuitos. Mas o grafeno é diferente. "A energia dos elétrons não é dissipada", diz Pereira. "Isso dá a ele características fantásticas para a eletrônica."

O material é particularmente útil para circuitos de alta frequência – que vêm a ser justamente para onde a indústria de eletrônicos está caminhando.

Dispositivos como telefones celulares exigem cada vez mais frequência, à medida que os engenheiros tentam empilhar mais informações no sinal – e quanto maior a frequência, maior será o efeito de aquecimento, "No momento, o grafeno parece o caminho mais promissor para o futuro", diz Novoselov.

Vale do Carbono
Um mercado ainda maior para o grafeno poderia ser a fabricação dos sensores de fóton que detectam informação transportada em fibras ópticas de telecomunicações, avalia Novoselov.
No momento, a tarefa é cumprida pelo silício, mas seus dias podem estar contados. Em outubro, o grupo de Phaedon Avouris no Centro de Pesquisa Thomas J. Watson da IBM, em Nova York, apresentou o primeiro fotodetector de grafeno. Na prancheta de projeto também estão células solares feitas de grafeno e telas LCD.

Mais importante ainda, o grafeno pode se comportar como um semicondutor, permitindo o fluxo de informação eletrônica pela alternância entre os estados de condução e isolamento. Esta mudança de comportamento – fenômeno que está na base de transistores e, portanto, de toda a indústria de computação – baseia-se em materiais cujos elétrons estão organizados em estados de energia que têm o chamado gap de energia. É a capacidade de controlar os gaps de energia do silício que o tornou o semicondutor preferido. Como o grafeno não tem esse gap, durante muito tempo parecia que não era possível existir um "Vale do Carbono" para competir com o "Vale do Silício", mas isso mudou em 2008 com a descoberta das "nanofitas" de carbono.

Semicondutor
Quando o grafeno é cortado em fitas de menos de 10 nanômetros de largura, suas propriedades eletrônicas sofrem uma mudança dramática. Devido à forma como os elétrons são forçados a se mover através das tiras estreitas, a nanofita de grafeno passa a ter gap de energia. Isso o transforma em um semicondutor pronto para desafiar o silício no seu próprio jogo.

A fabricação de nanofitas ainda é um problema. Inicialmente só era possível produzi-las quebrando uma folha de grafeno. Isto era feito por meio de produtos químicos que rompem algumas das ligações carbono-carbono, por ultrassom, ou com um microscópio de varredura por tunelamento que serra os átomos, Com todas essas técnicas, no entanto, as quantidades produzidas foram mínimas. Então, em junho do ano passado, Pablo Herrero-Jarillo, do MIT, mostrou como as nanopartículas de níquel podem ser usadas para recortar nanofitas em folhas de grafeno. O método permite cortes tão perfeitos que poderia ser usado para criar nanocircuitos de grafeno.

Feixe de plasma
Ainda no ano passado, Hongjie Dai, da Universidade de Stanford, em Palo Alto, Califórnia, fatiou nanotubos de carbono em fitas com um feixe de plasma de argônio. Como os nanotubos já são produzidos em massa – a Mitsubishi, por exemplo, faz toneladas por ano -, essa é uma rota promissora para a nanofita. Com o método Dai, "a possibilidade de fazer toneladas de fitas também está aqui", diz Mauricio Terrones, do Instituto de Pesquisa Científica e Tecnológica em San Luis Potosí, México.

Há, no entanto, formas mais sutis de transformar o grafeno em semicondutor, e elas podem tornar as nanofitas ultrapassadas antes mesmo de chegarem à linha de produção. "Você pode gerar uma fita sem ter de cortar a fita", diz Pereira. Uma maneira de fazer isso é colocar o grafeno sobre uma estrutura pré-moldada. A tensão induzida em cada curva e dobra dará à folha uma variedade de propriedades eletrônicas. Resta saber se tais promessas se cumprirão além das paredes do laboratório. Como Avouris aponta, muitas das experiências até agora têm sido realizadas em condições bastante favoráveis – a baixas temperaturas, que mantêm o ruído eletrônico no mínimo, por exemplo. "A física e a engenharia básicas já foram feitas, e tudo é muito promissor", diz ele, "mas as pessoas esquecem que isso ocorre em condições idealizadas." Segundo Geim, é cedo demais para dizer se o grafeno vai desbancar o silício.

Mas não se pode descartá-lo, diz ele. Como o grafeno não é nada mais que uma camada de átomos de carbono, as combinações com outros elementos vão alterar radicalmente sua resposta ao calor, luz e outros estímulos. Na prática, a revolução dos eletrônicos baseados em carbono já começou, e Geim prevê muitas outras aplicações. "Quanto às propriedades magnéticas, supercondutoras ou mecânicas, ou mesmo à química básica, nem sequer começamos a brincar", diz ele.

FONTE:http://info.abril.com.br/noticias/ciencia/o-futuro-e-do-carbono-29042010-4.shl

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